Etapa final para conclusão do curso A Arte e a Técnica do Afresco, execução de 13 murais artísticos criados pelos alunos da Oficina-Escola de Manguinhos (OEM) teve início em edifícios públicos previamente definidos pela equipe envolvida no projeto da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz). As primeiras obras vão compor a Igreja de São Jerônimo Emiliani, na comunidade de Varginha (Manguinhos), visitada pelo Papa Francisco em julho de 2013 durante a Jornada Mundial da Juventude, com um projeto de Marcos de Oliveira Teixeira; e na Paróquia Nossa Senhora dos Navegantes, na Maré. Nesse local, haverá quatro murais assinados pelos artistas e alunos Virgílio Dias, Rafael Bteshe, Vladimir Valente e Fábio Cerdera.
O conjunto de pinturas deverá estar concluído em agosto. Diretor da COC, o historiador e pesquisador Paulo Elian, destaca a seleção das áreas contempladas e a parceria com o artista Lydio Bandeira de Mello. “Este projeto é a combinação perfeita de nosso compromisso com o tema do patrimônio cultural e da sua relação com a cidade. A escolha desses espaços públicos para execução dos murais de afresco coroa uma iniciativa da qual muito nos orgulhamos. Porém, vale destacar que nossa grande fonte de inspiração foi o artista Bandeira de Mello, generoso, criativo e um parceiro incansável na concepção desse presente que oferecemos à cidade do Rio de Janeiro”, afirma Elian.
A iniciativa da COC reafirma sua posição de preservar e compartilhar um saber artístico e cultural ameaçado de desaparecer no Brasil, visando deixar os murais como legado à cidade para marcar os 115 anos da Fiocruz e ainda os 450 anos do Rio de Janeiro.
Os murais vão compor, também, edifícios nas seguintes localidades: Biblioteca Parque de Manguinhos, Biblioteca Parque do Alemão (espaço compartilhado com a Clínica da Família), Estação Palmeiras (Teleférico do Alemão); Polo Experimental do Instituto Municipal de Assistência à Saúde Juliano Moreira (IMASJM), na Taquara; Igreja São José Operário, na Vila Autódromo, em Jacarepaguá. Durante a execução, será possível visitar o trabalho dos artistas e seus auxiliares com agendamento prévio e gratuitamente.
Para a Biblioteca Parque de Manguinhos, foram selecionados quatro murais de autores diferentes. Haverá projetos dos artistas Alex Mendes Nery, que explora os temas livro e conhecimento; Chung Cheng Hssiung, abordando a capoeira; Vinícius Queiroz Gomes, autor de “Noturno em Manguinhos”, composição inspirada na obra do escritor Ariano Suassuna e no filme “O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro”, clássico do Cinema Novo dirigido por Glauber Rocha; Luana Manhães, que apresenta “A Dança”, inspirada nas “Três Graças”, tema da mitologia grega presente também na obra de Homero.
Escolha de espaços e alunos
A equipe da OEM analisou 30 edifícios candidatos a receber os murais. Foram levados em conta o acesso irrestrito ao lugar por parte da população e o espaço adequado à pintura. A avaliação técnica incluiu igrejas, escolas e bibliotecas. Já a seleção dos alunos foi feita entre 70 candidatos, dos quais 14 foram escolhidos. A seleção envolveu a realização de pintura ou desenho pelo candidato e um teste de habilidade específica (35 estudantes fizeram a prova).
Entre os atributos dos edifícios escolhidos, foram verificados aspectos como a valorização e a boa visualização, a conservação das obras por estarem próximas aos campi da Fundação, em Manguinhos e Jacarepaguá, em locais elevados assegurando baixo risco de danos.
Com dimensões de 3,40m x 2,40m (largura x altura), os murais ficarão expostos – sem adoção de vitrine -, com iluminação especial e elemento de proteção dos topos das paredes. Todo esse trabalho será orientado, acompanhado e supervisionado pelos especialistas da COC, por intermédio da coordenação do curso e pelo pintor e professor Lydio Bandeira de Mello.
A iniciativa tem gestão cultural da Sociedade de Promoção da Casa de Oswaldo Cruz (SPCOC) e patrocínio da Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em Saúde (Fiotec), por meio da lei de incentivo da Secretaria de Cultura do município e das empresas Sanofi e Concremat, através de lei de incentivo do Ministério da Cultura. Também contou com apoio da Universidade Santa Úrsula (USU), da Escola de Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EBA/UFRJ) e do Senai/RJ.
Lydio Bandeira de Mello
Mineiro de Leopoldina, Lydio Bandeira de Mello, de 86 anos, é hoje um dos raros artistas brasileiros que dominam com precisão a técnica do afresco. Desde a sua graduação na Escola Nacional de Belas Artes (Enba/RJ), em 1951, seu talento e apuro técnico têm sido reconhecidos com extensa premiação: Prêmio de Viagem ao Estrangeiro no Salão Nacional de Belas Artes (1961), Grande Prêmio de Figura Humana na exposição Geral de Belas Artes do IV Centenário EBA/UFRJ (1965), Grande Prêmio de Retrato na II Exposição Geral de Belas Artes do IV Sesquicentenário EBA/UFRJ (1966).
Nos anos de 1961 e 1962 o artista viveu na Itália, onde se dedicou a estudar os grandes muralistas que se destacaram na Idade Média e o Renascimento. Executou dois painéis no Santuário de Poggio Bustone, em uma ermida (pequena igreja) construída por São Francisco de Assis em 1209 e reconstruída parcialmente após ser atingida por terremoto em 1948. Esse trabalho de Bandeira de Mello é considerado uma das grandes obras brasileiras em âmbito internacional. Dentre as pinturas no Brasil integradas à arquitetura, destaca-se o painel monumental da Caixa Econômica Federal, escolhido por concurso público e pintado em 1969, que hoje se encontra no Espaço CAIXA Cultural Rio de Janeiro.
O curso
Ao promover o curso A Arte e a Técnica do Afresco, a COC tem o objetivo de preservar a técnica de pintura mural, cuja origem remonta há cerca de 5 mil anos, na Mesopotâmia e no Egito. No Brasil, a arte corre risco de ser extinta. O afresco foi muito utilizado por gregos e romanos na antiguidade clássica e por mestres italianos do Renascimento. A técnica consiste em pintar diretamente sobre o revestimento ainda fresco da parede, em argamassa de cal, com pigmentos diluídos em água que penetram e a ele se fundem.
No Brasil, há registros da arte no período colonial, sobretudo após a chegada da família real e da Missão Francesa. No entanto, teve projeção no início do século 20, com as obras monumentais do ecletismo e do modernismo arquitetônico. No Rio de Janeiro, destacam-se pinturas de Eliseu Visconti, no Theatro Municipal; e de Cândido Portinari, no Palácio Gustavo Capanema. Em Porto Alegre, atraem atenção as pinturas de Aldo Locatelli no Palácio Piratini.