Anísio Teixeira, Noemy Silveira, Isaías Alves e Lourenço Filho. A trajetória dos quatro educadores brasileiros, a partir de suas experiências no Teachers College da Universidade de Columbia, em Nova York, entre os anos de 1927 e 1935, foi a base da apresentação da historiadora Ana Rocha, na primeira edição do Encontro às Quintas deste ano. O evento é promovido pelo Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz).
Vencedora do Prêmio Capes de Tese em História 2017, Ana Rocha especializou-se na área de história da educação, estudando especialmente o intercâmbio de ideias entre Brasil e Estados Unidos. A sua tese Experiências Norte-Americanas e projetos de educação no Distrito Federal e em São Paulo (1927-1935): Anísio Teixeira, Noemi Silveira, Isaías Alves e Lourenço Filho foi defendida em 2016 no programa de pós-graduação da Casa de Oswaldo Cruz, sob a orientação do professor Robert Wegner.
Em sua apresentação no Encontro às Quintas, Ana Rocha detalhou o processo de sua pesquisa, que começou com a análise do trabalho de Isaías Alves com os testes de inteligência nos anos 1930. Responsável por organizar o arquivo pessoal do educador na Universidade Federal da Bahia (UFBA), a historiadora ampliou a sua pesquisa com a inclusão de Anísio Teixeira, Noemy Silveira e Lourenço Filho, para pensar em como a experiência comum de especialização no Teachers College da Universidade de Columbia influenciou as ideias e a carreira de cada um deles.
“Eu tenho duas interseções nessa pesquisa: a psicologia, que é o mote inicial, com os testes de inteligência, e a viagem para o Teachers College. Todos eles em algum momento da sua trajetória vão para lá fazer especialização. A ideia era pensar essa relação antes de viajar, na viagem e quando voltam, como aplicam as teorias que conheceram nos EUA”, explica Ana Rocha.
Os contextos brasileiro e norte-americano
Os quatro educadores brasileiros vivenciaram sua especialização em educação nos Estados Unidos entre os anos de 1927 e 1935 e depois retornaram ao Brasil, realizando seus projetos, sobretudo, em São Paulo e no Rio de Janeiro, então Distrito Federal. O desafio da pesquisa de Ana Rocha era analisar e comparar os significados particulares e comuns dessa experiência. A historiadora enfatiza a importância de se compreender tanto o contexto brasileiro quanto o norte-americano para o desenvolvimento do trabalho. “Todos eles são mais ou menos contemporâneos, mas encaram questões muito semelhantes de maneiras diferentes”, afirma.
No tumultuado período entre a 1ª Guerra e a 2ª Mundial, os educadores norte-americanos tinham como foco a revisão do currículo nas escolas secundárias enquanto no Brasil se discutia a necessidade de democratizar e modernizar a educação e investir na formação diferenciada do professor. De acordo com Ana Rocha, esta é a “época da virada” na relação entre educação e ciência. “Para se modernizar, a educação precisa se relacionar com a ciência. Ela precisa sair do campo da prática e ir para o campo de uma prática apoiada na teoria. Para dar aulas, não serve mais apenas o intelectual. Ele tem que ter formação pra isso. Essa modernização tem um reflexo muito importante que é olhar para o professor e ver que ele precisa de um preparo específico para dar aula. Precisa saber dos métodos”, diz Ana.
Outro ponto realçado pela historiadora no Encontro às Quintas foi a importância de se entender o intercâmbio dos quatro educadores dentro do contexto maior de circulação de ideias entre o Brasil e Estados Unidos, com suas implicações políticas e econômicas. "Os intercâmbios deste período estão dentro de uma lógica de aproximação dos Estados Unidos com a América Latina. Existe uma política por trás disso que incentiva as verbas, na esfera privada e na esfera pública, tanto da parte do Brasil quanto dos EUA”, comenta Ana Rocha, citando a rivalidade entre Estados Unidos e França pela influência política e cultural no continente americano.
Para a compreensão dessas nuances, a pesquisadora também valeu-se da temporada que passou nos Estados Unidos, durante o doutorado, quanto teve acesso direto aos arquivos do Teachers College, da Universidade de Columbia e da Fundação Rockefeller, que financiava os projetos. A oportunidade permitiu que Ana Rocha cruzasse informações com os dados dos arquivos brasileiros, especialmente dos arquivos pessoais de Anísio Teixeira, Isaías Alves e Lourenço Filho. “A Noemy Silveira não tem arquivo pessoal, trabalhar com ela era trabalhar com fontes de outras naturezas”, diz Ana Rocha. Sobre a importância das fontes, aliás, ela é taxativa. “Em uma pesquisa dessas é preciso considerar muitos fatores. A gente no fundo vai sendo moldado pelas fontes”, conclui Ana.